Guilherme Braidotti Filgueiras.
Nos últimos cinco anos, temas que vinham sendo debatidos há três décadas passaram a ser decididos pelos tribunais superiores e – em alguns casos – deixando a União com o amargo sabor da derrota e os contribuintes ávidos por receber cifras que fazem a diferença em seus negócios. Este é o caso, por exemplo, da limitação do Sistema S à 20 salários mínimos, decidido pelo STJ no ano passado e a tributação do salário-maternidade pelo STF também em 2020.
Pode-se afirmar, portanto, que passamos por um momento em que os tribunais se voltam para temas tributários e, em anos de crise econômica prolongada, as empresas olham para essas possibilidades de recuperação de tributos, dando maior atenção a elas.
O país que em 2020 fechou o ano com R$ 702.9 bilhões de déficit, sendo que em 2019 já havia tido outro baque de R$ 88.9 bilhões, tem, por conta do movimento dos contribuintes em recuperar créditos tributários, maior perda arrecadatória. Vale ressaltar que no ano passado os contribuintes compensaram quase R$ 65 bilhões de créditos advindos apenas de ações judiciais (fora as compensações administrativas).
O Estado acuado responde de algumas formas e, uma das mais comuns, é pressionar o Poder Judiciário para que julgue alguns temas de formas convenientes a ele, fazendo com que decisões historicamente favoráveis ao contribuinte sejam revistas.
Esse foi o caso da tributação sobre o terço constitucional de férias, que teve o posicionamento completamente alterado pelo STF em 2020; e a exclusão do ICMS sobre a CPRB, contrariando a própria jurisprudência do tribunal no tema análogo de exclusão do ICMS da base do PIS e da Cofins. Porém, há temas em que essa pressão não produziu efeitos jurídicos, tendo sido julgados contrariamente à Fazenda.
Quando isso acontece, a Receita Federal inicia uma espécie de ofensiva, tornando a implementação desses créditos praticamente inviável, dificultando o aproveitamento de tais valores, como é o caso, por exemplo, da recuperação da verba de salário maternidade, que para ser concretizada exige a retificação, por CNPJ, das obrigações acessórias dos últimos 60 meses.
Analisando especificamente a questão da exclusão do ICMS da base do PIS e da Cofins, a Receita – depois de ter perdido judicialmente o tema, embora ainda reste a modulação de efeitos para ser julgada – lançou novo entendimento, dizendo que a recuperação deveria ser sobre o ICMS pago de fato, não o destacado na nota fiscal. Essa posição cria uma diferença brutal no valor a ser recuperado, e em alguns casos o crédito simplesmente deixa de existir. Não são raras as experiências de empresas que possuíam créditos de R$50 milhões e – com essa regra – passaram a simplesmente não ter nenhum valor à recuperar, ou seja, as empresas ganharam a ação, mas não levaram o dinheiro para o caixa.
Em fevereiro deste ano a Receita emitiu a Portaria nº 10, de 19/02/2021, criando uma equipe de auditoria que servirá para fiscalizar os créditos de exclusão do ICMS na base do PIS e da Cofins acima de R$ 5 milhões. Como, em regra, os valores envolvidos neste tema são superiores à 5 milhões, na prática quase todas as companhias serão fiscalizadas ao realizar este aproveitamento. Uma operação mal feita, acarretará possivelmente em uma contingência maior do que o crédito.
Ganhar uma ação não é suficiente, é preciso levar o crédito para o caixa, e para que tais fiscalizações não gerem um problema financeiro maior do que o benefício, as companhias deverão estar muito atentas à operação para o aproveitamento. Qualquer equívoco será empecilho e – com a criação deste comitê – a Receita certamente terá totais condições de identificar possíveis erros de implementação.
Desta maneira, a forma como as empresas retificam as obrigações acessórias, preparam os pedidos de restituição e compensação (PER/DCOMPs), apresentam a documentação e quantificam o crédito é que poderá ajudar a receber o que lhes cabe. Esses são os pontos em que os auditores vão se apegar porque a instituição já está vencida e precisa – urgentemente – diminuir os prejuízos, dificultando os caminhos para as restituições.